As Obras sobre Canudos
Relatos sobre a Guerra de Canudos foram fartamente publicados pela imprensa da época, em todo o País. Pelo menos uma dúzia de jornais enviaram correspondentes a Canudos, que transmitiam suas reportagens por telégrafo, mas sofriam censura militar. Essa censura, entretanto, foi rompida, na época, pelo Jornal de Notícias, da Bahia, e pelo Comércio de São Paulo, que mostraram os horrores da Guerra. Muito foi publicado na literatura de cordel. Muitos livros ainda são escritos no Brasil e no mundo.
Em 1899, o escritor baiano Cesar Zama denunciou os crimes e a truculência praticada pelo exército na campanha de Canudos (texto ao lado).
A obra mais conhecida são Os Sertões, publicada em 1902, do escritor fluminense Euclydes da Cunha (1866-1909), que acompanhou, como jornalista, a expedição do massacre. Para descrever a região, usou informações do baiano Theodoro Sampaio, sobre a Chapada Diamantina. Euclydes foi injustamente impiedoso na descrição psicológica de Conselheiro, notando que ele entrou para a História como poderia ter entrado para o hospício. Descreveu Canudos como uma urbs mostruosa, não considerando que visualizava uma cidade já semidestruída pelas batalhas.
Em 1982, foi publicado um romance sobre Canudos: A Guerra do Fim do Mundo, do escritor peruano Mario Vargas Llosa (Nobel de Literatura), que se debruçou sobre arquivos históricos e fez viagens ao Sertão Baiano. Vargas Llosa representou Euclides como um jornalista míope e Conselheiro, como um fanático.
Um melhor entendimento social do conflito foi exposto no filme Guerra de Canudos, do cineasta carioca Sérgio Resende, lançado em 1997.
Em 1999, foi publicado o excelente Canudos - Cartas para o Barão, da historiadora baiana Consuelo Novais Sampaio (1936-2013).
O livro O Clarim e a Oração: cem anos de Os Sertões, do escritor maranhense Rinaldo de Fernandes, lançado em 2002, é uma das melhores referências sobre Canudos.
A Guerra Total de Canudos, de Frederico Pernambucano de Mello (2007), também é muito bom.
Cesar Zama e Canudos
Cezar Zama (1837-1906) nasceu em Caetité, Bahia. Foi médico voluntário na Guerra do Paraguay, político e escritor.
Em 1899, escreveu o Libello republicano acompanhado de commentarios sobre a Campanha de Canudos, sob o pseudônimo de Wosley, publicado no Diário Bahia. Republicado, em 1989, pelo Centro de Estudos Baianos da UFBA (62 páginas). Abaixo, alguns trechos:
Esta página histórica não é o produto do interesse individual, ou da paixão partidária a incitar-nos a pena; do cenário político de nosso país nos retiramos de vez; é, porém, um tributo à verdade, onde povos e reis para não deixarem triste lembrança de sua passagem pela vida devem procurar luz e força.
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A situação da quase totalidade dos Estados da União é deplorável: finanças avariadas, e seus habitantes divididos em vencedores e vencidos. Estes têm sede e fome de justiça. Os vencedores negam-lhes pão, água, ar e luz.
Nenhum, porém, tão infeliz e aviltado, como a Bahia. A terra de tão nobres gloriosas tradições, a progenitora dos Cairus, Caravelas, Pedra Branca, S. Lourenço, Zacarias, Rio Branco, Nabuco, Cotegipe, Saraiva, Dantas e outros varões ilustres, que honraram a pátria, está reduzida a — anima vilis — sobre a qual todas as experimentações são impunementes permitidas.
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Sob o pretexto de pacificação, o solo do sertão encharcou-se de sangue. Essa intitulada pacificação fonte de lucros inconfessáveis para alguns, outra cousa não foi, senão o extermínio dos que ainda ousavam resistir às ordens imperiosas do dono da fazenda e seus feitores.
Os criminosos reais ficaram em sua maioria impunes, e os jornais da terra noticiaram que muitos deles foram incluídos no 5º corpo de polícia, que se organizara para a campanha de Canudos.
Só nestes tempos calamitosos e sob um governo de tal jaez se arrancam das cadeias públicas criminosos para fazê-los envergar a farda de mantenedores da ordem e defensores das instituições!
A guerra de Canudos foi o requinte da perversidade humana.
O ódio a dous antigos correligionários, depois adversários, que ousavam ainda enfrentar o dominador e a faina ingrata de conquistar, fosse como fosse, um distrito eleitoral, em que esses homens exerciam e ainda exercem influência incontestável, foram os móveis, que a provocaram.
Não há necessidade de declinar-lhes os nomes. A Bahia os conhece bem.
Pelos meios ordinários essa conquista era impossível. O governo da Bahia só crê no direito da força. Espalhar a polícia por aquelas paragens, prendendo, intimidando, devastando fazendas e criações, como já fizera nos sertões do Oeste com a famigerada pacificação, pareceu-lhe eficaz.
Era ainda possível que esses dous adversários e inimigos resistissem defendendo as suas vidas e propriedades e as de seus amigos. Seria azado o ensejo para suprimi-los. Canudos foi apenas o pretexto. É fácil reconhecê-lo.
No princípio era uma questão, que seria resolvida com cem praças apenas da brigada policial.
Recorra-se aos telegramas expedidos pelo governador da Bahia ao governo federal.
A justiça estadual não se ocupava dos habitantes daquele arraial. Contra eles não havia instaurado processo algum. Nos cartórios do Estado nenhum deles tinha o seu nome no rol dos culpados.
Nada de extraordinário se passava com relação a Antonio Conselheiro e aqueles, que o acompanhavam.
Ninguém ignora que gênero de vida levavam os canudenses: plantavam, colhiam, criavam, edificavam e rezavam.
Rudes, ignorantes, fanáticos talvez pelo seu chefe, que reputavam santo, não se preocupavam absolutamente de política.
Antonio Conselheiro porém confessava-se monarquista. Era seu direito, direito sagrado, que ninguém podia contestar em um regímen republicano democrático. Não há ato algum por sua parte ou dos seus que fizesse ao menos presumir que ele tentasse contra o governo da República.
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O Açude Cocorobó, que encobriu a área da Canudos histórica, mas suas ruínas ainda podem ser vistas em época de seca. Sua construção foi iniciada em 1951 e concluída em 1966.
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A. Ikishima