O Tratado de Tordesilhas

 

O Tratado de Tordesilhas definiu as áreas de domínio dos territórios ultramarinos, entre Portugal e Espanha.

O Tratado foi firmado em 7 de junho de 1494, na cidade de Tordesilhas, na Espanha, após muitas negociações. Ele definia uma linha de demarcação localizada a 370 léguas a oeste da ilha de Santo Antão, no arquipélago de Cabo Verde. Era um meridiano do Polo Sul ao Polo Norte. Caberia a Espanha, as terras do lado ocidental, e a Portugal as do lado oriental.

Contexto Histórico

Pela bula papal Romanus Pontifex, de 1455, Portugal já teria direito a todas as terras ultramarinas conquistadas e a conquistar.

As disputas pelo trono de Castela e as aspirações espanholas por conquistas ultramarinas levaram Portugal e Espanha a assinar o Tratado de Alcáçovas, em 1479, buscando a paz na Península. A Espanha assegurava o direito às Ilhas Canárias. Portugal assegurava o direito às ilhas da Madeira e dos Açores, e aos territórios conquistados ou a conquistar, ao sul das Canárias, desistindo da Coroa de Castela.

Interessante notar que, antes de Tordesilhas, o Tratado de Alcáçovas já dividia o mundo em duas partes entre portugueses e espanhóis, só que através de um paralelo, embora isso não estivesse claro no acordo. Assim, a conquista de terras ao norte das Canárias seriam, pelo acordo, de direito dos espanhóis, abrindo caminho para o descobrimento da América, patrocinado por eles.

Em 1492, Colombo teria desembarcado em terras portuguesas, segundo o Tratado de Alcáçovas. Toda a região do Caribe fica ao sul das Canárias. Portugal, com seu maior domínio em assuntos de cartas de navegação, protestou. A Espanha alegou que a expressão "as ilhas de Canária para baixo contra Guiné", do Tratado de Alcáçovas, limitava-se à região da costa africana. Era necessário um novo tratado.

Desde meados do século 15 e início do século 16, os portugueses eram a maior potência marítima do Planeta. Vários navegadores portugueses trabalharam a serviço da Espanha até o início do século 16. O próprio Colombo seria possivelmente português e não genovês.

Os Tratados de Alcáçovas e de Tordesilhas sugerem essa supremacia, pois os portugueses dominavam a África e a costa sul da Ásia. Possivelmente suspeitavam da existência de ilhas, onde está o Brasil, mas acreditando serem parte do extremo oriental da Ásia, indicadas em mapas da época.

Diferentemente da maioria das grandes potências do passado, Portugal buscava assegurar seus territórios através de acordos e com a benção do Papa. Era tudo cuidadosamente documentado e guardado na Torre do Tombo.

A expansão espanhola pelo Atlântico, no final do século 15, teve muito da influência do papa Alexandre VI (também espanhol), que tendia em favor de Castela. Mario Puzo (1920-1999), autor da trilogia O Poderoso Chefão, acreditava que esse papa, da família Borgia, tenha sido o fundador da Máfia italiana. Os portugueses conheciam o papa corrupto e exigiram dos espanhóis que Tordesilhas fosse celebrado sem sua participação. O acordo foi ratificado pela Igreja, apenas em 1506, pelo papa Júlio II.

Meridiano ou Simples Linha Geométrica ?

Não há dúvida que se tratava de um meridiano. Aliás, esse foi o motivo pelo qual o Tratado de Tordesilhas foi celebrado, pois Castela pareceu não ter entendido tal conceito, que já estava implícito no Tratado de Alcáçovas, de 1479. Nessa época, o conceito de meridiano não era dominado por todos os cartógrafos, pois o mundo, até então, era normalmente representado por uma espécie de disco que unia Europa, África e Ásia (mais em História da Cartografia).

Com a disputa pelas Molucas (atualmente na Indonésia), do outro lado do mundo, o conceito de meridiano, entendido como um plano vertical que divide o globo em dois hemisférios, ficou sedimentado. Os portugueses estabeleceram-se lá, em 1512. Em 1521, navegadores espanhóis (expedição do português Fernão de Magalhães) exploraram as ilhas e Portugal apresentou protesto, afirmando serem ilhas lusitanas. Tanto Portugal, quanto Espanha recorreram ao Tratado de Tordesilhas para reivindicar as Molucas. O maior problema não estava nos conceitos, mas na tecnologia da época, que não permitia grande precisão, devido aos erros de longitude. Os cosmógrafos portugueses não chegaram a um consenso com os cosmógrafos espanhóis, pelo conceito estendido de meridiano.

Em 1529, a questão foi resolvida diplomaticamente com o Tratado de Saragoça, definindo-se um antimeridiano, em oposição ao semi­meridiano de Tordesilhas. Houve concessões das duas partes. Portugal ficou com as Molucas, mas pagou indenização.

Os Erros de Tordesilhas

Tordesilhas foi a primeira tentativa de delimitação de território em que a forma esférica da Terra fez grande diferença. A delimitação por uma paralelo, como no Tratado de Alcáçovas, era algo relativamente simples, mas o uso de um meridiano mostrou-se um desafio para os cosmógrafos da época e resultou em erros grosseiros, em muitos casos. O sistema de construção das cartas de marear usadas pelos portugueses e espanhóis, até boa parte do século 16, tinha base nas cartas náuticas do Mediterrâneo, em que não existia qualquer projeção cartográfica.

Para se ter uma ideia dos erros grosseiros que existiam, o Planisfério de Cantino, de 1502, o primeiro mapa do Brasil conhecido, indica a Linha de Tordesilhas passando pela Guyana Francesa (o planisfério de Juan de la Cosa, dito de 1500, foi na verdade adaptado posteriormente, como demonstrado por Duarte Leite).

A delimitação das terras portuguesas, principalmente abaixo do trópico de capricórnio, não era consenso entre portugueses e espanhóis. As estrelas que se veem muito ao sul não são as mesmas vistas ao norte. Além disso, a determinação das longitudes era um grande problema da época e explica, em parte, as distorções nos mapas de então.

Os portugueses sustentavam que suas terras íam além do Rio da Prata, o que incluía o atual Uruguay. A Espanha insistia que suas terras envolviam boa parte da atual Região Sul do Brasil. Existiam diferenças entre as técnicas náuticas adotadas entre portugueses e espanhóis, além disso, acredita-se também que existiram erros propositais, com fins políticos, em certos mapas divulgados na época.

Para os portugueses, o Brasil era limitado ao sul pelo Rio da Prata ou até o Golfo de San Matías, na Argentina

Frei Vicente do Salvador (Historia do Brazil, 1626-1630) citou que o cosmógrafo-mor português Pedro Nunes (1502-1578) disse que o Brasil começaria "alem da ponta do rio das Amazonas da parte do Oeste no Porto de Vicente Pinsó que demarca em dous graus da linha equinocial para o Norte, e corre pello Sertão athe alem da Bahia de São Mathias (atualmente, Golfo San Matías, na Argentina), por quarenta e quatro graos, pouco mais, ou menos, pera o sul, e por esta medida (dis o mesmo cosmographo) tem o Brazil pella costa mil e quinhentas legoas". Vicente do Salvador observou que, na prática, o Brasil não ia além do Rio da Prata.

Também Rocha Pitta citou que as terras portuguesas estendiam-se até a Bahia de São Mathias, além do Rio da Prata (Historia da America Portugueza, c. 1724)

O Papa Gregório XIII concordava com os portugueses quanto aos limites do Brasil até o Rio da Prata, por isso a Prelazia criada, em 1575, com sede no Rio de Janeiro, tinha seu território eclesiástico estendendo-se até o Rio da Prata.

Somente na segunda metade do século 17, os cosmógrafos passaram a adotar regularmente o método de Galileu para a determinação de longitudes, com base nos eclipses das luas de Júpiter. Assim, por volta de 1720, o lendário cartógrafo francês Guillaume de l'Isle (1675-1726) e Premier Geographe du Roi, encarregado de reformar a cartografia francesa, observou que a Colônia do Sacramento, atualmente no Uruguay, estaria fora do domínio lusitano, segundo Tordesilhas.

O rei D. João V, em busca de melhor embasamento para negociações com a Espanha, enviou ao Brasil, em 1729, dois matemáticos jesuítas, Diogo Soares e Domingos Capace, com a missão de levantar dados mais precisos sobre os limites dos territórios da América Lusitana. Capace faleceu em 1736, mas Diogo Soares continuou o levantamento até 1748. Obviamente, os resultados obtidos eram segredo de estado.

As polêmicas sobre a linha da demarcação de Tordesilhas, entre portugueses e espanhóis, durou até 1750, com o Tratado de Madrid. Mas os problemas com a divisão das terras continuou por longo tempo.

Por Jonildo Bacelar, engenheiro eletricista, geodesista e editor do Guia Geográfico.

 

 

Fagmento do mapa português Terra Brasilis, de 1519, com uma bandeira portuguesa em terras da atual Argentina.

 

 

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Parte da Cidade de Tordesilhas (TORdeSyllo) em desenho de
Anton van den Wyngaerde, de 1565-7. Acervo do Victoria and Albert Museum, Londres (clique na imagem para ver a original).

 

Rio de Vicente Pinzon, indicado por Albernaz (1640), na margem esquerda da foz do Rio Amazonas, no atual Amapá. Era considerado em textos portugueses, incluindo de Pedro Nunes, como o local por onde passava o Meridiano de Tordesilhas.

 

Versões do Meridiano de Tordesilhas sobre um mapa político atual da América do Sul (mapa em projeção conforme, com meridianos em paralelo). O Meridiano de Tordesilhas, indicado como convencional, é encontrado na maioria dos livros de História do século 20. Entretanto, não era esse o traçado considerado pelos portugueses e esse conceito tem deturpado a maioria dos textos sobre a História do Brasil do século 16. As Capitanias Hereditárias do sul tinham, para os portugueses, um território muitas vezes maior que normalmente considerado na maioria dos textos atuais. Para os portugueses, por exemplo, o Uruguay era brasileiro, por isso fundaram lá a Colônia do Sacramento, em 1680. Mas havia incertezas, o que contribuiu para a tardia colonização do Sul do Brasil.

As demais versões do Meridiano, aqui indicadas, levam em conta apenas as características geográficas indicadas por seus autores, em lugar de coordenadas, pois essas apresentavam muitos erros no século 16. Os Meridianos de Albernaz e Pedro Nunes não eram tortos, os mapas é que eram. Veja também as considerações sobre o Meridiano no Cantino.

 

Brasil mapa antigo

 

Os edifícios onde foi negociado o Tratado na Cidade de Tordesilhas, em 1494. São duas casas unidas, que foram restauradas para fins culturais. Abrigam uma biblioteca e o Museu do Tratado de Tordesilhas. Ficam na Província de Valladolid, na comunidade autônoma de Castela e Leão.

 

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Por Jonildo Bacelar